segunda-feira, 28 de abril de 2008

Rodrigo Jacques

1.És natural de onde? Idade?
De nascimento sou do Rio de Janeiro /RJ em maio de 1964. Mas foi por acidente, a cidade é maravilhosa, porém meu coração pertence à “Cidade Heróica”, Jaguarão /RS.

2.Qual sua relação com o campo, cavalo, cavalo só crioulo? Como é a tua relação com a raça e os eventos ligados a ela?
Todas possíveis. Minha família paterna é de equitadores, clássicos, esportivos e funcionais. A família materna é de criadores de gado e cavalos. Não fiquei um mês da minha vida sem estar envolvido com isso. Estive transitando em diversas atividades eqüestres, mas sempre pensando nos nossos cavalos da pampa e jamais deixei de admirar excelentes cavalos em raças diversas, a generosidade e o caráter não são privilégio da raça A ou B. Participei de algumas exposições funcionais, credenciadoras e muitas provas por aí. Mas o trabalho do dia a dia de estância é maravilhoso, poético, simples e ao mesmo tempo rico em detalhes que o torna factível descreve-lo poeticamente.
3.Suas referências e influências de vida (música, literatura, pessoas) e como elas agem nas suas decisões?
Primeiramente na influência como pessoa, encontro-me bem servido dentro da própria família. Meu pai e minha mãe são inatacáveis neste aspecto, a conduta me foi indicada por eles, ademais leram e lêem muito sobre história, cultura e atualidade seguidas por parentes próximos e amigos íntimos que sempre aportam boas coisas.
Música é arte e sendo assim, muito pessoal. Criei-me escutando folclore platino e um sem número de grupos e ícones povoam minhas influências. Los Fronterizos, Los Cantores de Quilla Huasi, Alfredo Zitarrosa, Santiago Chalar, Los Altamirano, Luis Alberto del Paraná (Paraguai), Los Huasos Quincheros (Chile). Posteriormente comecei a escutar música popular brasileira, Almir Satter, Renato Teixeira, Oswaldo Montenegro. Muita gente boa faz parte da influência, essa corrente que me leva até onde estou agora.
Sempre gostei da literatura brasileira, o que nos faziam ler no colégio nunca foi sacrifício para mim. José de Alencar, Machado de Assis, Erico Veríssimo. Ricardo Güiraldes é eterno no seu romance e Hernandez escreveu a bíblia dos gaúchos. Não vou falar de poetas porque não caberia neste espaço.
Quanto ao envolvimento nas decisões, normalmente se manifestam quando peço, senão esta tudo bem.

4.Como começaste sua relação com a música, com a composição?
Meu primeiro contato com o violão foi em Asunción, Paraguai, onde moramos por dois anos, e peguei o gosto pelo instrumento. Mas comecei a compor em 1999, quando já morava e trabalhava em Jaguarão. Pressão saudável de amigos como Egbert Parada, Paulo Timm e Martim César Gonçalves.

5.O que fez com que tivesse certeza de seguir a carreira, o que te fez escolher a música nativista? De poeta a cantor, explica pra gente um pouco dessa ligação.
Eu acho que não escolhi a música folclórica, ela é que me escolheu. Nada mais natural que eu compor aquilo que me criei escutando. Além do mais, o convívio com a estância, como disse no início, te traz uma inspiração particular. Jamais vais empurrar uma tropa ou juntar um rebanho cantando axé!!

6.O que te incentiva continuar?
Costumo dizer que, aos que Deus deu o dom de criar arte, devem retribuir disponibilizando-a seja de que forma for. Divirto-me muitíssimo nos festivais, encontro amigos, onde trocamos risadas e idéias. É a minha válvula de escape mais utilizada atualmente já que, como engenheiro agrônomo, tenho uma conduta por vezes muito estressada e as pressões habituais me consomem.

7.Como te imaginas daqui a algum tempo dentro cenário musical?
Trato de não pensar muito nisso, mas preparo o campo para divulgar o que crio em apresentações, mais que em festivais. Teorizo que os festivais são importantes para apresentação de novos valores mais que como meio de vida. Neste momento em que acompanho o desenrolar do disco recém lançado, aguardo para ver que rumo seguir, mas creio que a tendência é de mais apresentações e menos festivais. Vamos em frente que atrás vem gente!
8.Os sacrifícios que já fizeste pela música?
O que mais sinto ter que optar é entre um festival grande e passar o fim de semana na costa do rio Jaguarão, eu realmente preciso daquilo. Normalmente chego lá na estância à noite e, já no amanhecer, a gente nota a diferença dos sons e do ar.

9.Arrependes-te de ter feito algo ou não ter feito pela música?
Às vezes penso que comecei tarde, mas ao mesmo tempo, jamais propus escrever nada antes disso. Caminho a passos pensados para não ter resposta para esta pergunta.

10.Inspirações para compor?
Está no ar, no verde, no serviço de campo ou numa conversa à beira do fogo. Numa paisagem bonita, conhecer uma pessoa interessante, enfim, por todos os lados. Não se procura inspiração, ela te acha e cai na tua cabeça.

11.Tem alguma música que gostaria de ter feito e não fez, e o que fizeste e tens um carinho especial?
A única frustração que posso dizer que tenho é não conseguir escrever poeticamente em português, embora me considere com bom vocabulário, creio que ele me serve apenas para laudos e pareceres. Sou um patriota convicto, adoro o meu país, jamais viajo ao exterior sem levar minha bandeira e exponho sempre que sou alvo de atenção.
Quanto a gostar mais ou menos das músicas que fiz é difícil dizer, é como querer que um pai prefira e diferencie o trato a seus filhos, são todos filhos. Digam vocês!

12.O que almeja que sua música alcance?
Reflito que, o ápice da criação poético musical acontece quando o artista toca o coração dos que o escutam, seja por versos graves e reflexivos, ou seja, por espalhar alegria. No meu caso em particular, me esforço para fazer-me entender a despeito de escrever em outro idioma já que, no meu credo, toda a pátria de bombachas é um povo só e a língua, mera formalidade. Todos podem entender, de um lado ou de outro. O preconceito está com os dias contados.

13.O que tem ouvido mais nos últimos tempos? Último Cd que compraste?
Tenho ouvido muita música riograndense, temos ótimos criadores e me delicio ouvindo excelentes letras e melodias. Mas nunca deixo de ouvir folclore em espanhol. Ainda outro dia adquiri um DVD excelente dos 40 anos do grupo MPB4.

14.Show que foste - livros que têm lido? Último livro que compraste? Qual show gostaria muito de ver e ainda não tiveste oportunidade?
Nos festivais onde toco, trato de não perder nenhum, desde que goste. Tenho muito a aprender sobre postura e desenvoltura no palco. Ando muito envolvido com livros técnicos e de legislação, isso não me sacia a vontade de ler, mas me ocupa sobremaneira o tempo que dispenso a esta atividade. Acho que o ultimo que li foi “Fronteira Rebelde”.

15.Como vês a influência da música da região do Prata na música nativista?
Vide Quarto de Ronda nº. 15. Falei muito sobre isso. É uma realidade que vem a enriquecer nosso cancioneiro e da minha parte, continuará crescendo.
16. Como encaras a relação da música popular brasileira e a música nativista?
Existe uma linha tênue em ser popular ou nativista, um ícone nativista pode ser extremamente popular sem deixar de ser folclórico, e um artista popular passa a ser folclórico no momento que “canta sua aldeia”. As duas expressões coexistem e se apóiam em uma só coisa, o povo, o consumidor, este sim deve ser trabalhado. Como? Disponibilizando qualidade e conteúdo.
17. Festivais, primeiro festival, composição e parceria?
Oitenta e cinco por cento do que tenho editado em disco de festivais são letra e música minhas, mas as parcerias são espetaculares na troca de estilo e no encontro do que se perde quando escreve uma letra. No CD lançado, abri mão de algumas parcerias simplesmente por comodidade e apreensão, mas elas virão se Deus quiser.
No Canto Inter-Universitário, o CIRIO em setembro de 1999, subi por primeira vez no palco do teatro Guarany em Pelotas, para defender “De las Lanzas” , uma milonga de minha autoria.

18.Como encaras esse meio ao mesmo tempo aberto, democrático, mas também bastante criticado por certa impressão de “panelas” dos festivais? Festivais em SC? Triagem aberta?
Uma vez já me manifestei sobre certas impressões. Primeiramente: chiam os que perdem e perde que fala demais, amanhã ou depois a criação dele cai nas graças de um jurado ou uma linha de jurados e ele muda de opinião. Julgar arte a partir de um nível é subjetivo e, em um festival com linha definida e jurados coerentes, prioriza-se um tipo de composição que alguns autores daquela linha criam. Muda a orientação, mudam os favorecidos. A virtude da música que está nos festivais é a diversidade. Essa diversidade levará nossa música além das fronteiras do estado, como já está em SC e alhures.
Estive em Lages na 9ª Sapecada e fui muito bem tratado, adorei a acolhida e, embora longe da fronteira, minha música foi bastante aplaudida. E isso realmente me importa. Tem uma letra minha na 2ª Nevada, em parceria com “El Anden” de La Plata, Argentina.

19.Fala um pouco da tua experiência nessa trajetória dos festivais? Triagens, premiações?
Bom, como disse, comecei em 1999 com De las Lanzas, mas a primeira em disco foi Del Este, uma chacarera no 2º Martin Fierro. Desde então nos festivais onde a música em castelhano é aceita, costumo passar música e me realizo com isso. Tenho uma pendência no Musicanto, uma vez fui com uma milonga, outro ano com uma zamba e uma chaya, mas jamais coloquei música no disco. Não sou de muitas premiações e admito que a língua, nisso prejudica um pouco, pois é quase impossível um júri unânime quanto ao espanhol. Tenho um primeiro lugar, melhor letra, um melhor tema campeiro, melhor apresentação de palco. Preocupo-me com o registro das obras, passar para o disco é o que realmente faz a diferença, no momento que galgas este patamar, tua obra e teu nome ali ficarão pelos anos enquanto existir o disco.

20.Vencer o bairrismo é algo que inevitavelmente, acontecerá... Ou achas que não existe essa diferenciação de estados? Acreditas que algum dia a música mais trabalhada (gaúcho-nativista) alcance um respaldo maior dentro do cenário musical brasileiro?
O bairrismo existe, mas muitas vezes sai de dentro, mas é o sustentáculo da individualidade de um estado. Prestem a atenção na forma como os ritmos praticados no Uruguai e na Argentina adentraram aqui, houve alguns insistentes que bateram até abrirem uma frestinha na porta, hoje a fresta já esta maior. Assim temos que pensar quanto ao resto do Brasil. Discordo do uso da expressão “música mais trabalhada”, já não é novidade as freqüentes incursões de nativista aqui do Rio Grande do Sul nos festivais nacionais em SP, PR e RJ, estes são desbravadores, estes pagam para tocar, mas estão abrindo o Brasil para os menos empreendedores que irão logo a seguir, pois temos qualidade para isso. Só não esqueçam deles, são heróis.
21.O que pensas sobre a realização de festivais fechados, achas que seria possível fazer um festival apenas de música nativista instrumental, que pensas sobre isso?
Os festivais fechados são laboratórios, eles permitem a maior troca de informação e a formação de parcerias muitíssimo mais rápido já que todos estão bebendo da mesma fonte. Quanto à música instrumental, enquanto músico acho fundamental sua continuidade e aperfeiçoamento, porém, sendo público, vejo complicada a concentração em torno disso já que as letras são normalmente mais compreendidas que as melodias. Ideal é misturarem-se.

22.Como é a sua relação com os outros músicos/poetas de SC e RS?
Considero-me iniciante no ambiente, mas tenho conhecido ótimas pessoas, que poderão ou não ser ótimos músicos. Podes aperfeiçoar tua arte, mas teu caráter não. A cada novo local que vou encontro novas caras, de poetas, instrumentistas e cantores, cada vez com mais qualidade, isso é garantia de seguimento.

23.Como é pra ti saber que sua música ganha fronteiras além do RS? Como você vê a receptividade da música feita aqui nos países do prata?
Maravilhoso! Recebo mensagens de SC, RJ, MG, DF onde rodam alguns temas que me pedem, no Uruguai, no Chile, no Paraguai e na Argentina também. Isso me instigou a fazer logo meu disco. Eram músicas de triagem e agora melhoramos muito a qualidade para tentar ser mais justo com os que me ouvem.

24.Como lida com o assédio que vem naturalmente como resposta ao trabalho que desenvolve? Como é tua relação com os fãs e com os novos músicos?
Isso é muito fácil, me sinto muito contente por receber este carinho já que é ele que me inspira a seguir compondo e tocando por aí. Sempre que possível trato de convidar e estimular músicos novos a se expor mais. Só lembro que é tênue a linha entre ajudar os novos e manter o nível das apresentações.

25.Viver de música: utopia ou realidade?
É realidade, quantos o fazem e são felizes.

26.Fala um pouco da música instrumental gaúcha e brasileira como um todo? Tua visão sobre como ela é vista e aceita pelo publico. Acredita que a parceria de músicos do RS com músicos do nordeste/norte acrescenta, decrescenta ou é indiferente para a popularidade da música em si e do instrumentista?
O Borghetti e o Yamandú que o digam, eles estão fazendo a parte deles. Costumo dizer que somamos mais que subtraímos e, dentro daquele principio que o meio é o formador do homem e sua cultura, certamente fusões regionais sairão redondas e bonitas. Água mole em pedra dura....

27.Qual é a melhor coisa do ambiente dos palcos, dos festivais, rodeios...?
O companheirismo dos que se garantem, são com quem vale a pena conviver, e não tenho dúvida que são maioria.

28.Como vês a divulgação que é feita das músicas em geral, dos festivais? Rádios, gravadoras?
Gostaria de ver uma distribuição melhor de discos, principalmente de festivais, tenho ouvido seguidas queixas dos que tentam ouvir minha música. Acho que as rádios andam bem, os horários estão cada vez mais importantes, é sinal que a audiência melhora também.

29.Primeiro CD. Fala um pouco dele, das parcerias, gravadora, receptividade do público, como foi a preparação para o lançamento, como foi a festa no Teatro Sete de Abril, e agora com o filho livre para voar já pensa num próximo trabalho?...
Neste momento, fim de abril de 2008 apenas entrou no mercado a gravação e estão nos chamando para apresentações em programas de rádio e televisão. As músicas que escolhi para este primeiro disco são da linha campeira, penso que são mais minhas, quase sempre para cima, alegres. Fizemos uma noite ótima no Theatro Sete de Abril, casa cheia, deu tudo certo apesar de duas ausências inesperadas. Seria maçante enumerar todos que participaram, são amigos e são todos importantes. Caso venha a ser gravado outro disco, acredito que o faremos mais livre, algo campeiro, mas muita coisa festeira.
30.Em linhas gerais como avalia a tua imagem e responsabilidade sendo uma pessoa pública e voz para sentimentos de muitas pessoas?
Pouco penso na imagem física, me preocupa sim o exemplo que posso estar dando, isso inspira cuidado.

31.A ânsia andarilha faz parte desse mundo festivaleiro, que pensas sobre isso... Estar sempre na estrada? Como fica o coração nesse caminho? A família?
O gaúcho por si só tem uma origem errante e despertar este atavismo não dói nada. A família viaja no coração da gente, nunca pede explicação.

32.Acreditas que a música feita hoje sobreviverá à voracidade e volatilidade do mundo de hoje, resistindo e sendo lembrada daqui a algum tempo? Acredita e/ou aposta em alguma composição sua que perdurará longos tempos?
O que é bom perdura, o modismo sem sustentação evapora. Quanto a durar, sei de temas que já estão na boca de muita gente ainda antes de lançar o CD, mas é cedo para afirmar algo conclusivo.

33.Que times torces, comidas, bebidas?
Colorado de coração, mas fora do estado torço por qualquer gaúcho, inclusive o grêmio. Sou um carnívoro e um assado de costela é incomparável. Gosto de bebidas clássicas vinho, cerveja, uísque.

34.O que te faz sentir de alma lavada?
Um trabalho bem feito, prestar uma ajuda na hora certa, um amigo sendo elogiado.

35.O que te faz sentir-se mal?!
Saber que ainda tem quem acredite que só se sobe abaixando os outros, injustiça e mentira.

36.Fala um pouquinho da tua vida fora dos palcos?
Normal, sou engenheiro agrônomo, caseiro e extremamente apegado à família e nossos bichos. Trabalho bastante para poder viver cada vez melhor e agradeço a Deus por ter toda esta sorte.

37.Planos pro futuro?
Agronomicamente, procurar manter-se na ascendente financeira e de realização profissional. Musicalmente prefiro esperar a repercussão do disco. Muita calma nesta hora.

38.Mensagem para as pessoas que admiram seu trabalho?
Espero seguir correspondendo às expectativas e agradeço todo o carinho. Insisto para que se manifestem, assim fica fácil saber onde pisamos e a cobrança é que nos faz crescer. Comprem o disco e leiam o encarte, é tão importante quanto à sonoridade da obra. Tem informação, tem poesia, tem cores e ares que complementam o que se ouve.

39.Sua relação com a internet, msn, orkut, afins e enfins?
Não estando em diligencias de campo, trabalho no computador e sempre conectado. Já não é possível viver à margem disso. Musicalmente tem sido uma ferramenta de inestimável valor, divulgação, informação, contatos e acessos rápidos. A possibilidade é enorme, tem que saber usar.

40.Acreditas na federalização dos estados brasileiros?
Por formação não, mas pode ser um caminho para não precisar sustentar outros.

41.Como vês a relação da música nativista com as rusgas das entidades tradicionalistas?
Acho o MTG como se comporta, um malefício à tradição gaúcha (vide encarte do CD), partindo do princípio que uruguaios e argentinos não são gaúchos, não posso sê-lo, pela língua que canto e pelo sangue que me corre nas veias. Esta arbitrariedade com o certo e o errado só serve para criar polêmica e afastar gente que seria útil à difusão e o enriquecimento da cultura gaúcha. A tradição não é um trilho, é uma estrada ampla que aceita muito mais coisas que um lote de camisas brancas e lenços lisos andando na estrada com as colas dos cavalos juntando barro.

42. Contato pra show?
(53) 8413-9425 ou à noite (53) 32261029
rodrigojacques64@gmail.com